Em um salão de beleza, verdadeiro santuário de espelhos e confidências, duas mulheres travavam uma conversa fervorosa sobre a separação de uma influenciadora digital famosa, aquela mesma que acumula milhões de seguidores, filtros e curtidas. Sentada à espera do meu horário, eu escutava distraída, e o que começou como curiosidade se transformou em um misto de divertimento, ironia e, por fim, preocupação.

Com a intensidade de um debate político, as mulheres discutiam valores de pensão, disputa pela guarda dos filhos e especulavam sobre um possível novo amor dela – como se fossem íntimas amigas, embora jamais tenham cruzado com a influencer nem numa fila de supermercado. Essa cena ilustra uma realidade alarmante: numa era de conexões digitais, nos tornamos especialistas em vidas que não são nossas, espectadores fervorosos da dor e alegria dos outros enquanto nossa própria história fica em segundo plano.

Muito do que consumimos dessas vidas digitais é um espetáculo bem roteirizado. A influenciadora pode até parecer vulnerável em suas postagens, mas está vendendo produtos, promovendo suplementos e autores de autoajuda entre um story e outro. A vitrine digital não é pura realidade, mas um show onde pagamos ingresso com nossa atenção, nosso tempo e, às vezes, até nossa sanidade.

A obsessão cibernética cresce silenciosa, deslocando o protagonismo de nossa vida para a tela do celular. A pergunta que fica é: até quando vamos viver a novela digital de terceiros, negligenciando a nossa própria existência? Talvez seja hora de sair do salão – ou da rotina – com um olhar renovado sobre si mesmo, antes que o vício em histórias alheias consuma ainda mais nossa conexão com o real.